Discursos focados na
importância de mais investimentos para melhorar sistemas educacionais
são perigosos, porque podem oferecer uma escapatória aos profissionais
menos eficientes.
A opinião é de Andrés Alonso, um dos mais
respeitados especialistas em educação do mundo. Para ele, muitos dos
problemas das escolas são de gerenciamento.
Alonso diz, no
entanto, que aumentar investimentos é importante. Ele chama de
hipócritas os que gastam muito para mandar os filhos a escolas privadas,
mas afirmam que a melhoria no ensino não se trata de necessidade
dinheiro.
O reconhecimento de Alonso veio após sua gestão bem
sucedida como secretário de Educação em Baltimore, no Estado de
Maryland, EUA, cidade cuja região metropolitana tem 2,7 milhões de
pessoas.
Durante a sua administração, o número de alunos que
abandona o ensino médio caiu mais de 50%, e o desempenho dos estudantes
melhorou em quase todas as disciplinas e séries.
Alonso esteve em
São Paulo na semana passada para participar de um debate promovido pela
Fundação Itaú Social sobre programas de tutorias de professores.
Folha - Qual era a situação em Baltimore quando o senhor assumiu a secretaria?
Andrés
Alonso - A cidade tinha perdido matrículas por quase quatro décadas,
havia muitos problemas com resultados e uma enorme instabilidade de
liderança. Fui o sétimo secretário de Educação da cidade em dez anos.
Isso
passava uma mensagem ruim, porque as pessoas veem essas mudanças como
desmoralizantes. Mas também percebi uma convicção de que o futuro das
escolas importava mais do que tudo para as comunidades.
Percebi que
aquela sensação generalizada de se estar vivendo um momento de crise era
um poderoso mecanismo para conseguir apoio a ações que poderiam ter
enfrentado resistência antes.
Quais foram as medidas que ajudaram a reverter os indicadores educacionais ruins?
Acho
que foi uma combinação de coerência nas decisões que fossem as melhores
para os alunos. As estratégias de operação e distribuição de recursos
foram guiadas pela noção de que cada criança importa. Se você perde um
aluno, você perde recursos.
Levamos serviços para as escolas, como
assistência médica, de forma a garantir que os alunos pudessem ficar
nelas por mais horas.
Mudamos práticas antigas, como suspender alunos
com problemas de comportamento. Começamos a tentar entender o lugar
desses estudantes na estrutura social para pensar em formas de mantê-los
na escola.
Tentamos entender não apenas o nível de aprendizagem dos
alunos, mas também onde os professores estavam em termos de eficiência.
Assim, também podíamos criar mecanismos para melhoras.
Mesmo no meio da recessão financeira, nós criamos um programa para o desenvolvimento dos professores.
De onde vieram os recursos?
Nós
tivemos de tomar decisões muito difíceis. Cortamos os empregos do
escritório central em 33% nos meus primeiros dois anos para economizar
para outros programas que estivessem diretamente ligados às escolas.
Para nos tornarmos mais eficientes, começamos a transferir o controle dos recursos para as escolas.
Ao
mesmo tempo, fechamos escolas que estavam operando abaixo de sua
capacidade e não estavam obtendo bons resultados, e expandimos escolas
que estavam com bons resultados, para as quais os pais queriam enviar
seus filhos.
Expandimos a educação infantil. Aumentamos o número de
crianças de quatro anos de idade indo para a escola e fizemos com que
pudessem estudar o dia todo, de forma a dar um bom começo de vida
escolar para elas.
Como melhorar a qualificação dos professores rapidamente?
Eu
assumi em Baltimore quando as leis começaram a mudar, tornando-se bem
exigentes. Nos meus primeiros dois anos, demitimos 400 professores que
não tinham a qualificação necessária.
Desenvolvemos contratos que
ofereciam compensações segundo resultados. Criamos quatro níveis de
carreira de professor e um sistema de avaliação que poderia colocar os
menos eficientes para fora.
Os "professores líderes" eram os que
queríamos para melhorar a qualidade do sistema. Eles passaram a se
envolver na elaboração dos currículos e a ter suas salas de aulas
abertas a outros professores.
As mudanças estavam ligadas à ideia de
que iríamos criar incentivos e responsabilidades para os professores
mais eficientes. Para os menos eficientes, oferecemos apoio.
Existe uma receita de reforma que possa ser copiada?
Acho que a reforma precisa ser, principalmente, relacionada ao contexto e à cultura do sistema que precisa mudar.
Há
algumas reformas que são sobre acesso, que dependem de recursos e que
são mais facilmente implementadas. Quando as reformas precisam mudar
fundamentalmente o que está ocorrendo em sala de aula, o processo é
muito mais difícil.
Elas precisam ser parte de conversas honestas
sobre o sistema de crenças que as pessoas têm, as decisões que estão
tomando e o que é realmente necessário para educar com padrões elevados.
Esse
tipo de reforma precisa ser muito estruturado de acordo com as
características de cada sistema educacional, de cada cidade. O que é
claro é que as políticas e sua implementação precisam estar muito
alinhadas.
Muitas vezes, as pessoas acham que as coisas vão melhorar
se você mudar a regulação. Mas o que se descobre é que a implementação e
a capacidade das pessoas de fazerem as coisas de forma diferente é
muito limitada.
É preciso que as mudanças façam com que as pessoas
trabalhem de forma mais inteligente. Por isso, políticas como o uso de
monitores são boas soluções.
Melhorar escolas também é o trabalho de
melhorar as condições de vida nas comunidades e cidades. Quando você
entende que o desafio é sobre sistemas e não sobre escolas individuais,
as chances de sucesso são maiores.
No Brasil, há uma discussão
sobre aumentar os recursos destinados à educação. De forma geral, é mais
importante aumentar investimentos ou melhorar a gestão?
Acho que
muitos problemas das escolas são de gerenciamento. As escolas podem
fazer as coisas melhor. Mas também há problemas enormes sobre os
recursos necessários para tornar certas coisas possíveis em alguns
bairros.
Às vezes, as mesmas pessoas que estão gastando uma enorme
quantidade de dinheiro para mandar seus filhos para escolas privadas
dizem que não se trata de necessidade de dinheiro, o que é incrivelmente
hipócrita.
O desafio de dizer que tudo depende de mais recursos é
que você está dando uma escapatória para as pessoas que não estão
fazendo seu trabalho. Isso é perigoso.
Mas dizer que não é sobre
recursos é uma visão de curto prazo. São necessárias conversas sobre
escolas que não estão usando seus recursos de maneira adequada. Em
alguns casos, você precisa de recursos, em outros, de mudanças de
comportamento.
O que o senhor acha da situação da educação no Brasil?
Não
sei muito sobre o Brasil, mas minha impressão é que está enfrentando
alguns dos mesmos desafios que os EUA enfrentaram, como problemas de
desigualdade de acesso e de recursos. Há problemas de governança e de
trazer coerência para as políticas e suas implementações.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/167780-dizer-que-e nsino-depende-so-de-dinheiro-e-uma-desculpa.shtml
Fonte: Folha de S. Paulo - ÉRICA FRAGADE
quinta-feira, 5 de junho de 2014
DIZER QUE ENSINO DEPENDE SÓ DE DINHEIRO É UMA DESCULPA
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